Show: Planet Hemp: A Última Ponta
- Michele Costa

- há 4 dias
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A história começou em 1993. O Brasil entrava no regime democrático, mas os fantasmas da ditadura ainda ecoavam. Jovens buscavam novas formas de se expressarem e, assim, reencontrar a liberdade após anos de chumbo. No Catete, bairro da zona sul do Rio de Janeiro, um grupo de amigos uniu skate, rap, rock'n'roll, psicodelia, hardcore ao desejo de desequilibrar padrões. Surgia ali o Planet Hemp, uma banda-manifesto que encontrou no discurso pró-legalização da maconha e na contestação à violência policial a sua identidade.
Liderado por Marcelo D2 e Skunk, o duo formou a base do grupo, mas foi com a chegada de Formigão, Rafael Crespo e Bacalhau que o Planet Hemp se estruturou de fato. Entre prisões, polêmicas e perdas, o grupo, formado por BNegão, Formigão, Nobru, Pedro Garcia e Daniel Ganjaman. Com discos que se tornaram símbolos de resistência - Usuário (1995), Os Cães Ladram, mas a Caravana Não Para (1997) e A Invasão do Sagaz Homem Fumaça (2000) -, o grupo marcou uma geração e, com Jardineiros (Som Livre, 2022), voltou ao centro do debate público, marcando uma nova geração que era nova demais pra jogar fumaça pro alto na virada do século.
Trinta e dois anos depois, a ponta continua acesa: o Planet Hemp mantém a capacidade de provocar, de convocar e de atualizar discussões importantes na sociedade, sem abaixar a cabeça. Cada show é mais do que uma apresentação: é uma catarse coletiva em que som, atitude e consciência se misturam em uma energia que só o Planet Hemp é capaz de criar.

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Planet Hemp: A Última Ponta
Em 2025, o anúncio da turnê A Última Ponta acendeu um alerta emocional: seria esse o fim definitivo do Planet Hemp nos palcos? Após percorrer o Brasil, a turnê chegou em São Paulo no último sábado, 15, reunindo milhares de pessoas em uma despedida que é, ao mesmo tempo, celebração e manifesto.
Antes de entrar no estádio, era possível ver a rua do Allianz Parque cheia de polícias (um clássico de cada show da banda) e um ônibus do Choque, levando alguns fãs a rirem. A abertura ficou por conta do Baiana System que deixou o estádio quente desde o primeiro momento. Em seguida, uma playlist pré-show começou, com interações de Marcelo D2 vindo das coxias. Assim que o grupo subiu no palco (com um perdoável atraso de 10 minutos), a catarse se iniciou.
Antes mesmo da entrada no Allianz Parque, a rua já trazia um cenário familiar aos fãs: forte presença policial - elemento tradicional dos shows da banda - e até um ônibus da tropa de choque, que arrancou risos irônicos de quem passava. A abertura ficou por conta do BaianaSystem, que incendiou o estádio desde os primeiros minutos. Em seguida, uma playlist pré-show surgiu acompanhada de intervenções de Marcelo D2 vindas das coxias. Quando o grupo finalmente subiu ao palco a catarse começou.
Os vídeos e projeções mostrados nos telões imitavam páginas de livros que projetaram a história da banda por meio de manchetes, fotos e entrevistas. A Última Ponta não revisitou apenas a trajetória do Planet Hemp: resgatou também suas influências, contextualizou temas presentes nas letras e prestou homenagens a Chico Science, Marcelo Yuka, Fábio Kalunga e Skunk, fundador do grupo, falecido em 1994.

No palco, a banda manteve a precisão das bases, a agressividade dos riffs e a dinâmica vocal entre D2 e BNegão, que se revezam como se o tempo não tivesse passado - a potência dos anos 1990 segue intacta. As participações de Emicida, Pitty e Seu Jorge levaram o estádio ao delírio, mas foi com a entrada de Black Alien - "Esse é Planet Hemp pra caralho!" - que o show atingiu seu ponto máximo. Para fechar, João Gordo surgiu como última surpresa, dividindo o palco com o grupo. Visivelmente emocionado, Marcelo D2 agradeceu a cada membro e ao público pelo momento único que vivia, sentimento compartilhado entre todos os presentes.
Com sinalizadores, gelo seco e muita fumaça, a pista se transformou numa grande névoa, reforçando o imaginário e a mensagem do grupo. O coro dos fãs era ensurdecedor, mostrando que cada pessoa parecia afirmar seu próprio capítulo dentro da história da banda.
Mesmo que A Última Ponta represente o fim de um ciclo, nada do que o Planet Hemp construiu se encerra com ela. A banda pode estar se despedindo dos palcos, mas não do imaginário popular. A ponta pode ter apagado, mas a fumaça não vai se dissipar.




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