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Foto do escritorMichele Costa

Não Me Pergunte Jamais, de Natalia Ginzburg


Natalia Ginzburg
Não Me Pergunte Jamais Natalia Ginzburg

Anos atrás, uma amiga me disse que eu deveria ler Natalia Ginzburg. Concordei sem prestar atenção e confirmei que faria isso em breve - uma promessa que não aconteceu, já que na época estava obcecada por Joan Didion. No entanto, recentemente, terminei a leitura de "Não Me Perguntei Jamais" (Âyinê, 2022) e compreendi suas palavras: Ginzberg desperta sensações logo no primeiro parágrafo.


Os elementos que compõem "Não Me Pergunte Jamais" estão na capa: a procura da casa com jardim, o abajur da juventude e a solidão da infância. Além disso, a nostalgia está sempre presente. A obra reúne os textos que foram publicados no jornal La Stampa e contos divulgados no Il Giorno e no Corriere della Sera. Em "Advertências", última parte do livro, justifica a ordem cronológica escolhida: "Jamais consegui ter um diário, esses escritos talvez sejam algo semelhante a um diário, no sentido que fui anotando pouco a pouco o que ia lembrando e pensando; e por esse motivo, a ordem cronológica é a mais correta."


Revivendo os momentos de sua vida, o tempo de Natalia Ginzburg é interrompido para que o leitor preste atenção aos detalhes. Explico melhor: em "Bigodes Brancos", a escritora conta sobre sua infância, ou seja, a ida à escola sozinha, a inveja das colegas de classe e as novas amizades. Enquanto lia, tive a impressão de que o tempo parou para que eu pudesse prestar atenção e reviver a minha própria infância e o desconforto em conviver com crianças diferentes de mim. Ao relatar o seu passado, Natalia nos transforma em uma só pessoa para mergulhar nas imagens que cria.


"Não Me Pergunte Jamais" não é somente sobre o passado, mas também sobre a escritora italiana e nós. Ao compartilhar as diferentes épocas, Ginzburg apresenta suas facetas e suas ideias sobre o mundo e a existência, com humor e o ácido necessário para sobreviver, assim como a resignação de uma mulher que passou pelo governo do Mussolini e viu seu pai e irmãos sendo presos pelo totalitarismo.


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Em "A Casa", texto que abre a coletânea, conta sobre os dilemas que viveu com o marido para a compra da primeira casa: a procura recorrente por um lar que agradasse os dois e os filhos, a necessidade do jardim que lembrasse a casa de sua infância e os anúncios nos jornais. No entanto, o escrito vai além de uma edificação: "Ou será que na verdade eu não queria viver em casa nenhuma, nenhuma, porque o que eu odiava não eram as casas, mas na verdade era a mim mesma? E será que todas as casas, todas elas, não eram boas desde que outra pessoa morasse nelas, e não eu?".


"(...) Pelo resto da vida guardaremos aquele grito nos ouvidos, mais forte que o grito do vento e o estrondo dos rios; pelo resto da vida continuaremos ridiculamente a nos perguntar o motivo do grito e a responder que não importa; pois os fantasmas da angústia não têm nome e nem voz, os questionamentos da angústia estão fadados a permanecer sem resposta, os lugares da angústia estão não se sabe onde, em uma paisagem de nossa alma onde não sabemos se queima o verão ou o inverno. (...)"

Penso que Natalia Ginzburg era corajosa ao se colocar tanto em seus escritos, afinal, mostrar-se completamente não é fácil. Sua nostalgia e o amor pela literatura/escrita são contagiantes. Inclusive, são eles que dão o tom em "A Velhice", que como o título já diz, aborda a honestidade sobre o envelhecimento: "Me parece ainda mais piegas, e ainda mais censurável, a postura inversa, ou seja, que nos obriguemos a amar e seguir toda novidade que aparece. Essa é uma ofensa ainda maior à verdade. Pois significa ter medo de mostrar como estamos agora, ou seja, cansados, amargos, já imóveis e velhos".


Após despertar a atenção do leitor, queremos saber cada vez mais sobre os pensamentos da italiana que escreveu sobre diversos assuntos - e temos isso em "Não Me Pergunte Jamais". Ginzburg aborda o papel da crítica, o amor pelo livro "Cem Anos de Solidão", de Gabriel García Márquez, religião, filmes e peças. Não é possível concordar com tudo (ainda bem!), mas é possível aprender e refletir sobre o nosso papel e ideais no atual momento da vida.


"(...) Na infância eu não conhecera a tristeza: conhecera apenas o medo. E agora eu enumerar para mim as coisas que haviam me assustado muito na infância: um filme em que um homem chamado Cian aparecia sentado com uma faca; a faca era usada para cortar o pão, mas depois matava alguém; e como meu pai muitas vezes falava o nome do reitor da universidade, que se chamava Cian, e que ele não sofria porque era fascista, toda vez que ele dizia <<Cian>> eu via o pão e a faca e sentia um arrepio. Também tinha medo dos fascistas: de suas camisas negras, das faixas verdes que usavam nas pernas, de seus caminhões; e da canção <<Giovinezza>> e da Câmara do Trabalho, que fora incendiada; e de um chapéu masculino ensanguentado e empoeirado que uma vez vi ao lado de uma bicicleta estropiada, à beira da estrada; e de uma mulher que corria chorando e de um homem que a perseguia. (...)"

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