Afeto e Outros Esportes de Contato
- Michele Costa
- 25 de set.
- 2 min de leitura
Não precisa de muitas informações para saber que o novo disco de Bella e o Olmo da Bruxa é sobre sentimentos; a capa e o título são suficientes. Afeto e Outros Esportes de Contato é menos um disco no sentido tradicional e mais uma experiência catártica. O álbum não se contenta em oferecer apenas melodias ou arranjos bem resolvidos: ele escancara uma vulnerabilidade quase desconfortável, como se cada faixa fosse um exercício de exposição emocional diante do espelho — e do público.
A proposta do disco é ousada justamente por não buscar o conforto do ouvinte. Há algo de dolorosamente íntimo em cada canção, uma espécie de convite ao mergulho nos abismos da fragilidade humana. As letras - principalmente “Deus, Gay” e “Vou me Matar” - soam como cartas não enviadas, diários interrompidos, confissões que ecoam entre a ternura e o desespero. O afeto, no universo construído pela banda, não é um lugar de repouso, mas um campo de embate: o amor, o contato, a ausência e o silêncio transformam-se em esportes de sobrevivência.
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A sonoridade de Afeto e Outros Esportes de Contato é marcada por contrastes: guitarras que oscilam entre a delicadeza quase etérea e a distorção áspera; camadas eletrônicas que criam uma atmosfera densa, quase claustrofóbica. Esse tecido sonoro não serve de pano de fundo para as letras — ele disputa espaço com elas, intensificando o desconforto e a urgência que o disco deseja provocar.
As vozes, muitas vezes em tons contidos, quase sufocados, reforçam a sensação de exposição íntima. Não há potência lírica despejada em catarse — há, sim, uma escolha pela fragilidade como linguagem. Em alguns momentos, a contenção implode: berros distorcidos e ruídos emergem como se o silêncio não fosse mais suficiente para segurar a avalanche emocional.
O mérito de Afeto e Outros Esportes de Contato é justamente sua recusa à linearidade. O disco não é fácil porque, em algum momento, é possível se enxergar nas faixas. Dessa maneira, o álbum se constrói como um espaço de colisão, onde o afeto se mostra menos como gesto de ternura e mais como fricção, contato brusco, choque inevitável. O ouvinte é conduzido para um labirinto de reverberações e tensões que expõem a vulnerabilidade se impõe como verdade desconfortável, ou seja, pesada demais para suportar, mas impossível de negar.
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