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  • Foto do escritorMichele Costa

Yuri Costa não está sozinho

Atualizado: 9 de jan.

A frase "Quem tem amigos tem tudo" é ideal para descrever o momento em que o cantor e compositor Yuri Costa se encontra. Se no passado ele escrevia e produzia suas músicas sozinho, agora, celebra sua história com outros músicos na coletânea Ninguém é Forte Sozinho. São 45 músicas que mergulham em observações diárias, suas vivências e sentimentos que a vida desperta. 


A ideia da coletânea tem origem na ação espontânea de parceiros na música que estão sempre tocando as músicas de Yuri Costa, mostrando como essas canções os marcaram. Sabendo da importância do músico para outros artistas, o amigo Arthur Xavier preparou uma surpresa em seu aniversário: em um CD, ele juntou as canções que foram tocadas pelo músico em shows e encontros de amigos. A ideia foi tão boa que evoluiu, ou seja, o próprio Yuri Costa participou do projeto, selecionando outras canções para o álbum. Após a conclusão, acompanhamos a travessia de Yuri pelos olhos de outros artistas que demonstram como ele é querido na cena. 


É interessante acompanhar a trajetória dele: suas primeiras composições mostram como um jovem nos anos 2000 enxergava o mundo - paixões, namoros, fracassos, sonhos e angústias são alguns temas retratados. Já em Entre Morcegos e Aviões o Contato Perdido na Infância Flutuavam as Bruxas, seu último álbum, o músico compartilha seus medos através de fábulas que passam entre o carnaval e dia das bruxas. As letras estão mais robustas, mostrando que Yuri Costa está maduro e pronto para falar sobre o seu crescimento e desafios.


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Você escreve e faz músicas há muitos anos, né? 

Sim, eu comecei tocar por volta dos meus 14 anos e também foi uma época que eu comecei a compor as minhas primeiras coisas. Não compunha com tanta quantidade, [porque com] 14 anos eu tava começando a aprender música e a tocar violão, mas eu já fazia algumas coisas. 


Quando você percebeu que você queria entrar para este mundo? 

Eu tava pensando muito sobre isso, inclusive… Em 2023 fez dez anos que eu tô tocando e compondo, fazendo música, produzindo e gravando em casa, tudo sozinho - o sozinho é no sentido do primeiro momento. Eu acho que senti que eu queria seguir mais pra esse caminho quando eu senti que as minhas músicas conversavam com as pessoas, de certa forma. Apesar de ser uma experiência individual, as pessoas curtiam e gostavam. Por volta de 2013 eu comecei a tocar somente na internet, não fazia show para ninguém não. Gravava tudo que eu podia no celular ou outros aparelhos eletrônicos. 


São dez anos! Você vê uma diferença daquele início para agora? A música continua tendo o mesmo significado para você?

A música continua tendo o mesmo significado pra mim, mas eu faço outra música, com certeza. O mesmo significado inicial, tipo, eu acredito que até hoje a música é a coisa que mais me acolhe e que mantém a força e a energia empenhada. Claro, tem as outras funções: trabalho e estudo, mas, de certa forma, até trabalho e estudos estão vinculados a música em alguma medida. Então, ela que vai norteando grande parte da minha vida. A música, nesse sentido, é a mesma coisa de dez anos atrás. Mas a minha música, enquanto compositor, já mudou bastante - os temas já mudaram, os desafios são outros, até mesmo a linguagem. 

Inclusive, suas músicas já passaram por diversos temas, ou seja, como ser jovem nos anos 2000, questão política, vivências e angústias. Os temas estão amadurecidos, de acordo com o seu crescimento, né? 

Sim, sim. Se antes eu tava me preocupando em falar sobre o subúrbio do Rio de Janeiro, sobre namorinho de adolescente, hoje as letras ganham significados mais simbólicos, nem tudo é tão fácil, às vezes, elas podem ganhar novos significados mais efêmeros, mais fechadinhos. Mesmo assim, eu ainda acho impressionante como muita gente se emociona, mesmo com essas músicas um pouco mais densas, mais fechadas, porque acaba que cada um cria, de certa medida, a tua própria imagem do que pode ser aquilo, entendeu? 


Você falou sobre como a música te dá um norte. Como é esse norte? Ela norteia sua vida inteira?

Ela norteia a minha vida inteira, inclusive, em como ser um bom pai, como estar mais atento ao meu redor… Sempre achei que se você escuta música, se você produz música, você não tem muito direito a se limitar a um estilo, mesmo que você faça um estilo específico, então, eu sempre escutei muita coisa ao mesmo tempo - desde do reggae, piseiro, funk, MPB e pop, porque são as linguagens diversas. Às vezes essa linguagem tá na sua família, às vezes essa linguagem vai tá na rua ou no carro de som… E aí, eu me permito escutar essas influências e me nortear por elas, tipo assim: "acordei e vou colocar essa música e ela vai definir o meu dia", não é isso! Como essa música aparece no meu cotidiano e o quanto ela me toca, como me permito ser tocado pelas coisas que estão ao meu redor. [pausa breve] Nesse sentido de nortear, de direcionar, a música não me deixa quieto: eu tô sempre escutando música, tô sempre tendo muita atenção ao o que está acontecendo ao meu redor, mesmo com a música. E ela cria os vínculos, os vínculos que eu tenho com o espaço-tempo. Por exemplo: quando eu escuto Tropicália, do Caetano Veloso, eu lembro da primeira vez que eu fui ao museu, tinha 16 anos, lembro do caminho do metrô da minha cidade até o museu. Quando eu escuto músicas parecidas com a lambada, lembro da minha vó dançando na sala. Quando escuto alguma coisa, me remete a uma memória afetiva e acaba que a minha música tem muito disso, da memória afetiva, por conta dessa forma de se entender no mundo. 

Como é trabalhar com essa memória afetiva, ao mesmo tempo revisitar o seu passado e o que você era antes? 

Olha, eu vou te falar que não é muito fácil não. Foi até engraçado que no dia 16 de dezembro, a gente fez um lançamento aqui em comemoração ao lançamento da coletânea e aí eu propus fazer uma coisa que eu nunca fiz na vida: fazer um set livre, ou seja, só peguei a guitarra e falei: "o que vocês querem que eu toque?" e aí eu toquei. Mas umas [músicas] eu já não lembrava muito bem os acordes, não lembrava muito bem a letra, outras eu me emocionei, não consegui nem terminar, porque a letra tinha um significado muito específico para um momento muito difícil, então, nem consegui terminar. Tem músicas que eu já considero que são do público, tem uma música que se chama "Geografia", muita gente já tocou, muita gente já fez cover e tal, e é uma música muito pessoal e muito difícil porque fala da minha relação familiar que é conturbada… Por muitos anos foi um desafio danado tocar ela em público, mas eu gosto de me desafiar e tocava, mesmo sabendo que eu poderia me emocionar. Tem outras que eu ainda não passei por esse processo: de levar ao público, de tocar e ter uma troca psicológica, deixar de ser uma coisa tão pessoal minha para se tornar uma coisa nossa, entendeu? 

Como é essa troca? Como você se sente ao saber que as pessoas se emocionam com suas canções após se identificarem com elas? 

Olha, vou falar que não é fácil de assimilar não. Tem muita gente que poderia dizer: "ah, adorei, esse é o meu objetivo de vida…" Claro, como a gente se expressa artisticamente, a gente gostaria de que outra pessoa ouvisse e gostasse… Sinceramente? Eu não tenho nem dimensão pra falar como é a sensação de alguém, por exemplo, ressignificar minha música de outra forma, trazer pra vida dela, fazer cover ou algum tipo de releitura, eu acho muito simbólico, porque é de um artista underground, carioca, que pouca gente conhece e ter um espaço sentimental a ponto de alguém regravar… Me toca muito e eu tento, pelo menos, sentir uma ponta do iceberg da pessoa, tentar entender como é que foi esse processo. Posso contar uma história? 

Claro! 

Durante a pandemia aconteceu uma coisa muito engraçada: dos meus 16 até os meus 18, 19, 20 e 21 anos, eu toquei muito na rua; nas praças daqui da cidade, em saraus, em saraus na cidade e por aí vai. Aí chegou a pandemia e a pandemia deixou todo mundo em isolamento, todo mundo em casa e tal e aí uma vez, em 2020, pedi um negócio no mercado pra entregar e quando o motoboy veio entregar, ele subiu a minha calçada e falou: "caraca, é tu! É tu, o cantor, né? Da praça! Minha esposa é mó tua fã! Tira uma foto aqui comigo, ela vai ficar felizona" e foi embora. Eu fiquei pensando… A gente tava no meio de uma pandemia mundial, pedi um negócio, chegou um motoboy na minha casa e a esposa dele é minha fã, tirou foto… Tipo, talvez tenha sido a primeira vez que eu tive um impacto de fora da bolha. De certa forma, na minha cabeça, aquilo explodiu minha percepção! Minha música mesmo sendo estrainha comunica de forma popular, entendeu? 


"Eu decidi colocar as minhas músicas na internet durante a pandemia. Meu primeiro álbum lançado foi em 2020. Eu acredito que se hoje eu lancei coisas pela internet foi por conta desse período."

O que você deseja comunicar e passar ao ouvinte?

Isso é um negócio que me perturba na real. Inicialmente nunca penso em ouvinte, no público. Tudo que eu faço geralmente é muito espontâneo a partir do que eu tô vivendo… Mas depois do processo… O que ela for comunicar, independentemente do que eu acredito que ela pode comunicar, tem que ser quase como uma troca mental entre eu e a pessoa que tá ouvindo. Se eu puder comunicar alguma coisa é que as coisas, mesmo ruins, passam. 


Como é fazer músicas tão verdadeiras em um momento em que a gente pode viver, mas com um mercado tão pop e que pesa no marketing? Como ir contra essa correnteza? 

Eu acho que é mais parecido... [longa pausa] Como, sei lá, tomar um sorvete em um dia muito frio: é bom, mas seria muito mais prazeroso se fosse sol. Eu já me perguntei e me pergunto sempre, é uma coisa que realmente bate muito na minha cabeça. Ser músico não é minha profissão principal, mas se um dia for, eu teria que me adaptar ao nicho e ao mercado. E é exatamente nesse ponto que ainda me dá um pé atrás, porque eu não me sinto adaptado e eu gosto disso. Gosto dessa liberdade. Eu nem penso muito no que eu faria, porque eu não faria; o máximo que eu faria seria gravar minhas músicas de um  jeito hipotético que penso que deveria ser, mas também não seria voltado a satisfazer desejos ou algoritmos de algum aplicativo. 


O que me chamou muito atenção na coletânea é que contém 45 músicas… 

Isso também me dá uma chocada. 

Estamos acostumados com poucas músicas e talvez esse seja o padrão para o músico independente por questões financeiras. Mas o que chama atenção é que estamos em um momento em que as músicas precisam ser curtas para se adequarem a aplicativos ou ao que está na moda. Como vocês chegaram nessas 45 músicas?

Na realidade, a coletânea é uma surpresa pra mim, foi um presente de aniversário. Eu acho isso completamente incrível! Eu não sei e o Arthur poderia confirmar, mas acho que [a ideia] foi a partir de um show que eu fiz e quando acabou ele me perguntou o que ele poderia me dar de presente de aniversário e eu falei que seria uma coletânea. Eu sempre pirei muito nisso, cara. Vi artistas que fizeram sucesso e que faleceram e ao lançarem uma coletânea eles não veem, é tipo não ver o próprio funeral. Eu acho inaceitável eu não ver o meu próprio funeral. Não ver uma coletânea é como não ver o funeral, porque acaba tendo uma movimentação muito maior postumamente. Eu acho que comentei isso com o Arthur em segundos, falei meio brincando e nunca pensei que isso seria levado a sério [risos], mas ele levou a sério e bem a fundo. Pelo o que entendi, de agosto até dezembro, a semana do meu aniversário, tinham pessoas se movimentando para fazer coisas relacionadas à coletânea. No dia do meu aniversário o Arthur me fez uma festa surpresa na minha casa e me deu o CD físico e lá, se não me engano, tinham 27 músicas. Em 2023, o Arthur ainda tava nessa de querer chamar mais pessoas para participar da coletânea e foi um processo um pouco mais diferente, porque a primeira parte do processo foi uma surpresa pra mim, eu não vi nada e não acompanhei nada. Já em 2023 todo, eu já acompanhei com o Arthur, então, entraram uns novos artistas e o Arthur já planejando entrevistas e tal, eu já fui mais junto dele nesse processo. Mas eu ainda acho muita surpresa, ainda não consigo dimensionar… 

Como você se sentiu no primeiro momento, na entrega de um presente surpresa, até o momento em que você também começa a participar? 

Eu me senti muito emocionado. Um dia desses até escrevi um texto sobre isso. Acho que a palavra certa é amado, por conta do carinho, da disponibilidade do tempo e atenção para produzir um material tão detalhado com muitos detalhes pequenos - por exemplo: a coletânea saiu esse ano pela internet, mas também vai sair um documentário e a gente tá vendo possivelmente alguns shows em 2024. Eu acho que na cabeça do Arthur era somente um presente, mas depois se tornou uma grande coisa com diversas participações, com um monte de troca também. 


É muito curioso saber que durante a sua trajetória, você começou na música sozinho e agora tem uma coletânea com diversos músicos. Como é sair da "solidão" e ir para o plural com outras pessoas? 

Eu acho isso muito… [longa pausa] Acho que nem tem palavra para isso, mas eu posso descrever a sensação que é muito especial. De 2017 pra cá eu conheci várias pessoas que foram muito importantes - e aqui eu preciso citar o João Antônio, John, para os íntimos. O John tinha um evento que se chamava "Minha Casa Sessions" aqui no meu bairro e aí o "Minha Casa Sessions" foi um evento que basicamente que me ligou tanto ao João quanto a diversas possibilidades, porque como ela fazia um evento underground na casa dele, tinham diversos artistas que frequentavam aquela casa. Eu acredito que sair desse lugar solitário só se deu pelo momento que eu conheci o João, "Minha Casa Sessions" e diversos outros artistas que cantavam no mesmo lugar. Hoje, por exemplo, eu vejo outras relações: relações interestaduais que se deram pela internet. Acho isso muito interessante. Acho que nada disso seria possível se as pessoas não acreditassem nas letras, nas músicas, se não sentissem nada. 

Você pretende continuar trabalhando com outras pessoas? 

Então, isso é uma coisa importante: ao longo de 2022 eu fiz alguns shows sozinho e com o João na guitarra e eu comecei a ter uma vontade muito grande de ter uma banda de apoio, uma galera pra tocar junto. Então, final de 2022 e o ano todo de 2023 eu fiz shows com banda e as músicas se transformam em outra coisa, uma outra experiência, uma outra forma de interpretar ela e tal. Então, no momento que eu tô agora, eu tô mais a fim de fazer som com a galera, mas ao mesmo passo, eu não consigo ficar quieto! Eu lanço uma música só voz e violão. Um pouquinho antes da coletânea, eu lancei algo bem tímido - eu nem divulguei tanto e era só pra ter na internet - que se chama Entre Morcegos e Aviões o Contato Perdido na Infância Flutuavam as Bruxas. Se não me engano são nove ou dez canções com voz e violão, músicas do álbum que fiz em 2023. Lancei bem timidamente para, quem sabe, em 2024, revisitar essas músicas e gravar em estúdio e ser o meu primeiro álbum em estúdio. 



Todo esse trajeto, do sozinho para o acompanhado, das vivências as tristezas, me fez lembrar a canção "Google Maps", onde você diz: "Se você vier comigo / Vou achar um lugar". No final das contas, você encontrou esse espaço ou esse espaço só existe para você? Você está disponível para abrir esse local para outras pessoas?

Eu acho que eu entendo que eu ainda tô na pesquisa, ainda tô caminhando, tentando entender muitas coisas. Voltando para aquela conversa de indústria musical e tipos de música, cada vez mais tem uma necessidade muito clara, não só por algoritmos, mas por pressão das pessoas também, que as coisas estejam muito identificadas. Por exemplo: "eu sou um cantor de MPB" - a gente já tem uma imagem fechada do cara com voz e violão que canta uma música determinada. E criam uma imagem disso e essa imagem, dependendo do caso e do dia, pode ser meio frustrante, do tipo "fui lá ver o show do Yuri e tá lá o Yuri gritando que nem um maluco e eu só queria escutar uma música tranquilinha, porque eu escutei aquela música tranquila no Spotify". E tá tranquilinha naquele momento para o Spotify e hoje é outro momento. Em janeiro tenho marcado um show e esse dia eu vou fazer sozinho, vai ser com voz e guitarra, essa coisa mais tranquila de revisitar músicas mais antigas e novas e tô tentando me equilibrar em ter muita gente e ficar sozinho. É uma coisa complexa. 

Como encontrar o equilíbrio? 

Eu acho que sendo bem sincero consigo, acredito que encontrar o equilíbrio vem da sinceridade. No sentido… Me sinto à vontade a tocar essas músicas com banda? Pode ser que não, porque eu fiz agora e nem toquei elas, quero tocar sozinho… É isso! Gosto dessa sensação de vou tocar uma música que não faço a menor ideia de como as pessoas vão lidar e a gente vai ter essa troca em conjunto. Dependendo do caso, eu posso tocar com banda, enquanto outras músicas toco mesmo sozinho e tá tudo bem. Eu acho que [as] outras [músicas] dialogam melhor pra mim, não com o público, mas internamente sozinho. 


O que você espera do futuro? 

Olha, assim… Do futuro eu espero muito continuar fazendo música. Tem uma frase do Leminski que diz: "Ser poeta aos 17 anos é fácil, eu quero ver alguém continuar acreditando em poesia aos 22 anos, aos 25 anos, aos 28 anos, aos 32 anos, aos 35 anos, aos 40 anos...". A poesia e a música, na minha concepção, não são tão distantes. Requer uma sensibilidade em não se deixar emputecer pela vida, porque a vida é porrada. Será que aos 60 anos eu vou tá fazendo música? Será que eu vou ter o luxo do Caetano, de 80 anos, viver de shows? Quem sabe?! Mas confesso que gostaria de chegar aos 80 e postar numa rede social que eu quero ter férias radicais. 

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