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  • Foto do escritorMichele Costa

Os reflexos sonoros do Antiprisma

Isaac Newton descobriu as cores. Ao colocar um prisma em um feixe de sol, novas tonalidades surgiram. O arco-íris está estampado no álbum The Dark Side of The Moon (1973), do Pink Floyd, mostrando que a descoberta vai além da ciência: com ela é possível viajar para novos mundos. Décadas mais tarde, o objeto é transformado: torna-se circular, traz apenas três cores, leva o ouvinte para outros hemisférios e ganha o nome de Antiprisma. 


Formado por Elisa Moreira e Victor José, o Antiprisma é reconhecido por sua sonoridade contemporânea, transcendendo os gêneros de rock, folk, música popular brasileira e psicodelia. Com dez anos de trajetória, o duo está em constante mudança, imitando um prisma: se o violão era protagonista em Antiprisma (2014), primeiro trabalho lançado pela dupla, ele torna-se antagonista em "São duas horas e está tudo bem", single lançado neste ano, com a colaboração de Ana Zumpano na bateria e Beeau Goméz no contrabaixo. 


"Pensamos em fazer o som mais orgânico possível, sem subterfúgios, sem maquiagem, bastante orientado pelas guitarras e pela ideia de ser uma banda mandando ver em uma sala de estúdio", explica Victor. "E isso por si só já é uma novidade, já que essa faixa inaugura essa formação com Ana e Beeau e nos tira da nossa zona de conforto, que até então era nosso foco em sons acústicos. Destaco também essa temática mais pessoal, que deve constar em quase todo o álbum", completa. 


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Vocês estão no ramo há dez anos. Como vocês veem esse tempo de estrada? Aliás, quais foram as principais mudanças no Antiprisma? 

Victor: Durante esse tempo a gente viu de tudo, tocou em todo tipo de lugar. Tivemos trocas com diversas pessoas de várias ideias diferentes. Tocamos com bandas de todo tipo. E hoje a gente olha pra trás e vê como, na verdade, ter um projeto musical nos enriquece tanto quanto pessoa quanto artisticamente. É uma coisa incrível e muito bonita ver esse processo acontecer. Curtir a jornada é crucial e é o que há de mais precioso nisso tudo. E a gente fala em dez anos, o que parece muito, mas pra gente é como se fosse só o começo, sabe? Talvez por tudo ser feito de modo tão pessoal, às vezes até artesanal, o tempo passa a ter outro peso e valor. Antiprisma ainda é uma criança. 


Falando em mudanças, uma que é nítida, é o som. Quando vocês perceberam que gostariam de misturar outros gêneros musicais? 

Victor: Pois é. De certa forma, o que aconteceu com Antiprisma ao longo do tempo, já era previsto. Começamos fazendo um som totalmente acústico e bem cru, depois passamos a inserir um pouco mais de elementos, principalmente a viola caipira. Depois vieram as guitarras, um pouco de synth, samples, até chegar hoje nessa formação elétrica, em quarteto. E quando digo que isso já era previsto, é que pode parecer que o som mudou, mas na nossa cabeça a gente sempre imaginou nossas músicas como se fossem essencialmente de rock… indie rock, folk rock, psicodelia, blues, pós-punk, tudo isso. Na verdade, acho que a mudança nessa nova fase é mais pra fora, no jeito que a gente se apresenta pras pessoas. Porque pra gente, esse som que está acontecendo agora, continua sendo a nossa essência. 


As canções de vocês retratam as diferentes facetas da vida. Como tem sido abordar esses temas, como ancestralidade, amor, cotidiano, morte e vida? Cantá-los dá algum tipo de suporte necessário para continuar a trajetória? 

Victor: Tudo que a gente compõe é muito puro e pessoal. Então, sempre são temas muito caros para a gente. Ao longo desses dez anos, muita gente falou pra nós que escutar nossa música as levava para um ambiente completamente

diferente de onde elas estavam. Então tinha essa qualidade meio contemplativa em muitas músicas. Com o tempo abrimos cada vez mais as temáticas, até chegar nesse momento desse novo álbum que está por vir, que é muito mais orientado para o introspectivo mesmo, para os sentimentos internos, as sensações humanas. No "Planos para esta encarnação", nosso primeiro álbum, a gente falou muito sobre o tempo, sobre paisagens, lugares não explorados. Em "Hemisférios" a gente ainda tinha muito disso, mas até enveredamos para uma roupagem meio política, por exemplo em "Só Porque Você Não Se Encontrou". Então a gente se sente muito livre pra falar de qualquer coisa, sabe? Não tem restrições. Mas temos sempre em mente que a música precisa passar uma mensagem, é um paradigma. 


Um prisma, ao ser colocado no sol, reflete as cores. Como é ser um antiprisma? E qual é o objetivo de vocês? 

Victor: Sendo um duo, não acho que seria muito a nossa cara sermos Victor & Elisa, entende? Então, quando nomeamos o projeto de Antiprisma, foi muito mais pensando na sonoridade e na estética do que no significado em si. Para quem não sabe, Antiprisma é de fato uma figura geométrica, que por sinal, é muito interessante. Mas a gente nunca pensou nesse nome tendo um significado super certeiro. É legal que isso fique em aberto para cada um interpretar à sua maneira. Com o passar do tempo a gente percebeu que Antiprisma é um nome que intriga as pessoas. Mas do meu ponto de vista, gosto de pensar que é como se a gente retivesse as cores, que todas as cores estivessem à nossa disposição. E isso tem muito a ver com o nosso jeito de fazer música. Eu acredito que se você ouvir todo o catálogo do Antiprisma, você vai achar música de todo tipo de contexto e que se encaixa em momentos diferentes do seu dia. 


"São duas horas e está tudo bem" tirou o duo da zona de conforto - e é nítido isso. Como foi gravá-lo e entregar a sensação de viver intensamente o presente? 

Elisa: Essa música é uma das que foram compostas na pandemia. Então, para mim é bem claro que, apesar de falar em "está tudo bem", é meio que uma checagem, sabe? Uma fotografia do momento, daquelas que temos que tirar de vez em quando para ter certeza de que está tudo bem mesmo. Talvez seja nesse sentido a sensação de viver o presente passado pela canção. Mas a graça de lançar uma música é que justamente que depois que ela é colocada no mundo, ela não é mais só nossa, passa a fazer parte de quem foi comovido, tocado por ela, então acontece muito de falarem para nós interpretações das nossas próprias músicas que nem pensamos na hora de compor, mas que fazem total sentido. 

Victor: Ela é uma música muito importante para esse nosso novo momento, porque foi uma das primeiras que surgiram dessa nova leva de canções. E ela realmente traz essa sonoridade mais urgente, com mais guitarras, sendo uma banda tocando e nada mais. A gente gosta dessa ideia, ainda mais nos dias de hoje, que o que é orgânico está cada vez mais escasso. Eu acho que fazer um som com uma banda funcionando ao vivo, no estúdio, é como se fosse um statement, entende? E é uma música que veio de maneira muito rápida, tanto que a gente até ficou pensando, ‘nossa, será que isso existe?’ Porque isso acontece muito. Algumas músicas vêm rápido, chegam tão prontas que a gente até duvida! E foi praticamente a partir dela que começamos a desenvolver o repertório desse disco. 


Bemti participa de “Tente Não Esquecer”, uma canção que busca representar uma linguagem ao trovador. Como foi o processo e gravar com o Bemti? 

Elisa: A escolha de chamar o Bemti para cantar com o Victor foi bem natural. O Victor chegou com a música praticamente pronta, bem melodiosa e logo de cara pensamos "combina muito com a voz do Bemti". Nós conhecemos o Bemti desde a antiga banda dele, a Falso Coral. Lá no comecinho do Antiprisma, nós sempre nos acompanhávamos na cena, principalmente por conta desse aspecto cancioneiro e usar viola caipira, então rola essa identificação desde sempre, tanto que chegamos a participar de uma faixa do disco deles em 2019. 

Victor: Esse foi um bom momento pra gente revisitar os primórdios ali do nosso primeiro EP, que era super acústico, super trovadorismo, totalmente orientado pra essa linha. E como o Bemti é um artista essencialmente folk, foi muito natural fazer essa música, esse arranjo, para que ele participasse. E fizemos o convite e foi super tranquilo. Ele é uma pessoa muito querida, muito talentoso. E o resultado foi surpreendente pra gente, porque é uma música bem profunda. Uma música bem profunda e muito disso corresponde à performance dele. A gente conseguiu se entender muito bem nas gravações e extraímos o melhor de nós. 


Vocês estão preparando um novo álbum. O que podemos esperar dele? 

Victor: Eu acho que podem esperar um disco certeiro, direto, com uma banda funcionando muito apaixonada, tocando junto num estúdio, trocando aquela energia. Muitas músicas ali, as bases, - guitarra, baixo, bateria, ou viola, baixo, bateria - foram gravadas totalmente ao vivo com nossos queridos companheiros de banda e de vida Ana Zumpano (bateria) e Beeau Goméz (baixo). Além de Bemti, há algumas outras participações de gente muito incrível, o que nos deixa muito felizes. Tem música com cello, tem música com viola de arco, tem até música com faixa rítmica gravada com utensílios domésticos! Enfim, tem muita coisa interessante nesse sentido. Mas, acima de tudo, vai ser um disco em que todas as músicas são canções bem acabadas, sem subterfúgios, sem maquiagem, o mais verdadeiro possível e sem seguir qualquer tendência. As faixas são poderosas sendo o que são, e pra mim esse é o ponto forte do trabalho.



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