Anos atrás ouvi de uma conhecida que a vida ganha um novo sentido na adolescência. A puberdade não modifica somente o corpo, ela também molda o caráter do futuro adulto. O mundo - que antes era um lugar agradável e cheio de possibilidades -, torna-se cruel. Viver é mais do que perigoso: é extremamente difícil. Durante as minhas mudanças, lembro de me sentir sozinha, perdida e com raiva. Algo estava faltando. Entre angústia, ódio, cravos e espinhas, descobri a poesia marginal - foi neste momento que consegui me encontrar nas palavras de Ana Cristina, Torquato Neto e Cacaso.
Considerado um anjo muito louco, Torquato Neto deu vida aos seus escritos. Os textos da coluna “Geleia Geral” foram o meu primeiro contato. Os conteúdos despertaram algo que eu tinha esquecido: a arte cura as dores. Inclusive, é o melhor remédio para uma adolescente que não se encaixava em nenhum grupo. Depois vieram os poemas e, em seguida, as músicas. Comecei a recitá-los rapidamente, assim como escrevê-los no diário da época. Descobri que Torquato não era louco como diziam, mas um anjo sentimental, que te guia para um outro mundo, sem crueldade e com liberdade.
Lembro das palavras de Décio Pignatari para uma entrevista: “Torquato era um representante da nova sensibilidade de não especializados”. Não sei dizer o porquê de gostar dessas palavras - talvez tenha sido a verdade ou o toque rimbaudiano ou as diferentes estruturas que tinha seus poemas. Mas uma coisa é certa: o poeta falava para os marginalizados, os esquecidos, os solitários. “(...) e atrás dessa reticência / queremos / quero viver.” Como não se emocionar?
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Os anos passam e você não é mais um adolescente. No entanto, o sentimento de estar perdido continua presente. A angústia é mais forte. As dúvidas surgem o tempo todo, assim como as crises de depressão. Acabo caindo e me perdendo, mas o anjo continua guiando os seus seguidores.
Torquato Neto me ensinou que é de extrema importância acreditar e defender a ideologia, ou seja, não se vender em nenhuma oportunidade. Ele também mostrou que escrever auxilia nos processos da vida e são as palavras que vão relembrar o motivo de se estar vivo. Muitas vezes é necessário deixar sangrar para fazer sentido.
Pra dizer adeus
Adeus
Vou pra não voltar
E aonde quer que eu vá
Sei que vou sozinho
Tão sozinho amor
Nem é bom pensar
Que eu não volto mais
Desse meu caminho
Ah,
Pena eu não saber
Como te contar
Que o amor foi tanto
E no entanto eu queria dizer
Vem
Eu só sei dizer
Vem
Nem que seja só
Pra dizer adeus.
A angústia continua por aqui. O peso da existência também. Penso muito em Torquato Neto e os métodos que usaria para continuar presente em um mundo muito louco, afinal, tudo é perigoso, divino e maravilhoso. Não chego em nenhuma resposta. Por não ter tido a honra de conhecê-lo, não digo adeus. Nunca disse adeus e nunca direi, porque o camarada continua comigo. Let’s play that.
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