No século XIX, a câmara escura era utilizada para transmitir imagens em uma parede. Duzentos anos depois, a invenção se transformou nas mãos de Lucas Gonçalves: em uma sala sem luz, o músico compartilha suas músicas para sair dos diversos bombardeios de um mundo em guerra. Dito isso, observe a capa: o vermelho, a imagem nebulosa e as possíveis ilustrações que serão desenvolvidas durante o álbum.
Após a pandemia, Ucrânia e Rússia entraram em conflito. No início deste ano, terroristas invadiram Brasília e, agora, está acontecendo uma guerra sangrenta entre Israel e Palestina. Como é possível continuar vivendo e sonhando quando desastres continuam acontecendo pelo mundo? Acompanhado de seu violão, Lucas dá a resposta: pela música. Dessa maneira, "Memórias Vol.1" dá o tom para o álbum.
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Diferente de Se Chover (2020) que trabalha com o ambiente aberto e Verona (2021) que traz imagens em serras, Câmara Escura (2023) é um disco noturno, ou seja, no decorrer da narrativa, imagens são formadas, misturando o passado e o presente do músico e o nosso, já que Lucas observa as experiências de outras pessoas. Portanto, quando canta, ele abre janelas no pequeno cômodo para viajar pelo Brasil com os ouvintes.
A sensibilidade do artista em tratar o amor em dias conturbados pode ser vista em "Amor em dias de Mísseis" com o refrão "Louco é viver um amor em tempos de guerra". Porém, os conflitos não estão somente em lugares externos - eles também estão dentro de nós. Por isso, em "Absense" é preciso "Aceitar que dói pra sempre / Lembrar é um acerto bem no meio / É sobre desabar". Já em "Pra Quem Ficar", sonhamos e amamos ao lado do cantor.
A realidade é narrada em "Não Ficção" e "Juntos", canção que é acompanhada por um coral, mostrando que é possível mudar o mundo ao lado de outras pessoas. As imagens da câmara escura são vistas com nitidez em "Carro de Boi" e "A Bença, Vó", que nos faz lembrar de memórias do nosso passado que se misturam com as histórias contadas por nossos pais e avós. Aqui, as vidas se entrelaçam e somos marcados por sensações que variam entre amor, respeito e gratidão.
Passeando pelo folk, música brasileira e caipira, Câmara Escura traz canções feitas em Drop D - uma afinação na qual a sexta corda do violão é afinada em Ré, abaixo do Mi padrão - que transporta o ouvinte para outros tempos, com muita poesia.
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