Durante o crescimento é possível desenvolver diversas personas, afinal, a vida é cheia de oscilações. Porém, como suportar as mudanças? Sabendo das dificuldades, a banda Personas transmite angústias e urgências, inspiradas em relacionamentos e conflitos pessoais, com a missão de diminuir as dores do dia a dia para suportar a existência.
Assim como a vida, Personas precisou passar por alterações para chegar na formação e sonoridade de hoje. Mergulhando no emo, indie e rock alternativo, Rodrigo Cerqueira, João Capecce, Pablo Hanzo, Danilo Fernandes e Fernando Cerqueira, narram suas vivências e medos com muita maturidade. Assim, fica mais fácil lidar com os sentimentos, acompanhado de boas músicas.
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A banda surgiu em 2016, mas passou por mudanças para ser a banda que é hoje. Como foi essa transformação para vocês? Quais foram os principais impactos em vocês e para o processo? Hoje, vocês encontraram a sonoridade desejada?
A primeira mudança em si foi com a minha entrada na banda. Eu entrei no final de 2019, mas efetivamente foi em 2020 com os shows, né. Tava ali no início da pandemia e aí… Eu já comecei a tocar com eles e aí já rolou essa quebra por conta da pandemia e aconteceu tudo que aconteceu, infelizmente. Aí já havia uma mudança, né, porque Personas já tava em um processo de composição do ep Das Luzes Que Se Fundem com a Manhã e dá pra ver uma nítida mudança da sonoridade - do Nunca Foi pra Dar Certo para Das Luzes Que Se Fundem com a Manhã. A gente tava meio que… A ideia da época era assim: vamos fazer um negócio pesado e depois a gente vai pro dream pop e a gente deixa as coisas mais leves depois em um disco posterior. A gente compôs de uma forma mais pesada, a partir de influências que a gente sempre teve… Essa foi a minha soma nesse ep, né. Depois a gente teve outra mudança, uma outra edição que foi a do Danilo. Foi muito interessante porque como a gente já tava nesse processo de fazer com que as músicas fiquem mais cristalinas, mais leves, mais perto do dream pop, um rock alternativo, então, trouxe muitas sonoridades que ajudaram a gente atingir aquilo que a gente tava almejando. Hoje, o som do Personas é um pouco diferente, mas é muito da Personas, sabe? Somos muito o Personas do Nunca Foi pra Dar Certo e sempre vai ser, porque foi um marco na nossa vida, né.
Como foi entrar na banda, ser interrompida pela pandemia e depois voltar? A pandemia impactou vocês?
Cara, foi complicado porque… Foi pura insegurança, né. A gente nem sabia se ia voltar a tocar! Mas a gente sempre foi firme, tipo "a gente precisa continuar". Mesmo não tendo shows, a gente se virou bastante, conseguimos incentivos da cultura de São José também. Nós nos inscrevemos em alguns editais e conseguimos passar em alguns, de incentivos da cidade… Cara, São José é muito bom pra isso, sabe? São José abraça o artista de uma forma muito interessante. A gente conseguiu se beneficiar disso e isso deu um respiro pra gente, porque fizemos algumas lives e as lives deram até um gás. A gente ficou muito mais maduro por conta das situações que aconteceram no mundo - e acredito que todo o mundo. É complicado, todo mundo sofreu de alguma forma, perdeu um ente querido, então, a gente entendeu que precisamos viver, a gente precisa compartilhar aquilo que a gente tem de melhor, sabe? E é a música. Então, vamos viver intensamente para a música e compartilhar música.
Você acha que a pandemia deu esse novo significado para vocês?
Sim, com certeza. Acho que ela veio para impulsionar a gente, sabe? Estamos com mais fome de viver [risos]. Depois que passa por um processo desses, a gente fica "[precisamos] entregar tudo da gente". A gente precisa meter as caras mesmo, a gente precisa tocar em vários lugares que a gente nunca tocou; a gente precisa investir mais naquilo que a gente ama… É um lance de viver com intensidade.
Vocês trazem literalmente o Personas, trazendo as diferentes personas de cada um e como banda, mostrando que estão disponíveis para mudanças
Sim e acho que é legal essas mudanças, porque a gente não acredita que um álbum tem que ser igual ao outro, sabe? A gente entende que nesse próximo álbum que a gente tá planejando e começamos a gravar, nele a gente fala muito sobre isso que diferentes pessoas têm diferentes percepções sobre coisas iguais. É muito disso, sabe? Do que a gente tá buscando… Tentar tirar coisas diferentes de nós e é um processo infinito. E as mudanças vêm com a maturidade, tá todo mundo ficando velho, trabalhando, se matando de trabalhar [risos].
Por ser tão amplo o conceito do Personas e tão amarrado, porque são sempre a respeito das percepções e a gente tá sempre falando dos problemas reais. A pessoa que ouve desde Vazio, o primeiro ep, e ouve hoje, ela vai entender uma singularidade e uma pluralidade. A gente espera que as pessoas absorvam o máximo possível das fases da banda. A gente não sabe o que esperar do futuro, mas a gente quer sentir o sabor do futuro quando ele chegar.
As letras do Personas trazem as vivências, a importância de falar e a importância de viver. Existe um tom autobiográfico e incentivador para o ouvinte trilhar sua própria vida?
Sim, as músicas são totalmente autobiográficas. Os trabalhos passados eram escritos pelo Rodrigo e o João e todas as letras são, em si, sobre relacionamentos. A gente escreve para as pessoas se identificarem e gerar empatia entre as pessoas. Não falamos de coisas abstratas, falamos de coisas que a gente vive e que todo mundo passa. O Danilo começou a escrever algumas músicas, eu comecei a escrever algumas músicas… Então, no Qualia [próximo álbum da banda que está com um Catarse aberto] vai sair muita coisa diferente de tudo. É muito bom estar no Personas, porque a gente tem liberdade de poder escrever, de ver se as coisas se encaixam na banda - tem um dedinho de todo mundo.
Aliás, como funciona o processo de criação de vocês?
Cada um cria um pouquinho, mas geralmente, a gente faz de uma forma bem orgânica, porque a gente traz violão e voz e depois adicionamos os elementos nos ensaios, né. É muito um dedo de todo mundo, porque no ensaio, cada um coloca seus elementos, lógico, sempre respeitando o espaço de cada um.
O que levaram vocês a tratarem esses assuntos?
Eu acredito que é mais pelo lance da empatia, porque são anos bem complicados e, ao gerar empatia, traz uma união maior. Todo mundo tem problemas, todo mundo passa por situações complicadas… Falar sobre angústia… É ir lá no quarto da pessoa, quando ela tá sozinha angustiada, tá com ansiedade, sofrendo, é chegar naquele lugar e falar: a gente passa por isso também. Nós somos humanos também. Somos feitos das mesmas coisas e precisamos estar juntos para superar essas coisas. A gente não pode se entregar para essas questões, então, vamos passar por isso juntos e de mãos dadas. Eu acho muito doido quando alguém fala sobre isso, porque às vezes, a gente não consegue exprimir em palavras e quando alguém vai lá e canta uma coisa que eu tava sentindo…
O que vocês esperam despertar nos ouvintes?
[breve pausa] A gente realmente quer gerar empatia e identificação, que as pessoas colem no show e que elas realmente sintam aquelas letras que são tão verdadeiras e gravadas com muito carinho, porque a gente se doa por inteiro. Queremos que as pessoas se identifiquem de tal forma, sabe? Que impactam o coração também - o alvo é sempre o coração, né. [risos]
O desespero está presente literalmente na música E Eu Me Desespero Facilmente. Na letra, vocês cantam que não sabem para onde correr pela falta do diálogo com o outro. Vocês continuam se desesperando?
Sim, sim. Eu acho que é um processo infinito, a gente sempre vai ter falta de comunicação, ter essas questões mal resolvidas. Essa música é um grito mesmo. Foi o João que escreveu e é bem pontual esse lance de relações mal resolvidas. Acho que sempre vai ter uma coisinha ou outra pra gente se desesperar.
Será que é possível não se desesperar?
É difícil, mas acho que com esse processo de autoconhecimento, de maturidade, a gente vai aprendendo com as situações, a gente vai se blindando de algumas coisas…
Recentemente, vocês lançaram o single Caiu Para Trás que é mais intimista e que explora o sentimento de desgaste ao viver relações tóxicas. Como foi o processo de abordar esse assunto?
Em si, essa música não fala sobre relacionamento amoroso, ela [é sobre] relacionamento de amizade ou coleguismo, vamos dizer assim. Foi o Rodrigo que escreveu ela e eu acho que é uma música pertinente, sabe? Ela também é uma voz por desgaste, tipo assim: "tô cansado de viver essas coisas"... E ela é mó alegrinha [risos]. A gente ama essa música. A gente sabia que íamos soltar ela como a primeira música do álbum, sabe? A gente realmente gosta dela e acha que ela ilustra muito bem o que vai ser o Qualia.
Existe uma maneira para não cair para trás?
Acho que de certa maneira sim [breve pausa]. Acho que não vou saber explicar muito bem [risos]. Acho que o lance é enfrentar, mesmo que você esteja cansado. Infelizmente, o adulto tem que resolver as coisas, estando bem ou mal. É se jogar na experiência e vivê-la.
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