
A palavra éter remete ao quinto elemento, isto é, algo grandioso, possível de preencher além da esfera terrestre. Albert Einstein derrubou essa ideia ao apresentar a teoria da relatividade, no entanto, essa força sublime segue até hoje: há exatamente dez anos, Scalene lançava Éter , álbum que conquistou o Grammy Latino de Melhor Álbum de Rock em Língua Portuguesa em 2016. Com 12 faixas e uma sonoridade que passa pelo stoner rock e rock alternativo, a banda alcançou espaço na música brasileira. Ao longo da década, Éter se tornou um dos melhores trabalhos da banda, tanto pela sonoridade madura quanto pelas letras potentes e existenciais, que dialogam até hoje com os fãs - como é o caso de "Furacão" e "Loucure-se". Mas é com "Sublimação" que define o grupo: "Crie sua própria luz / O seu calor e sua missão / Infinitas chances vão surgir / Se permitir". De lá para cá, a Scalene foi se forjando cada vez mais na estrada e nas referências múltiplas absorvidas por cada um de seus integrantes, ganhando corpo numa discografia que ainda viria ter Magnetite (2017), Respiro (2019), o EP Folêgo (2020), indicado ao Grammy Latino daquele mesmo ano na categoria de Melhor Álbum de Rock em Língua Portuguesa, e Labirinto (2022). De 2022 em diante a banda entrou num hiato, retornado somente em 2024 para uma apresentação única e especial em Brasília. Em 2025 eles decidem sair pelo Brasil celebrando toda essa trajetória a partir de um repertório baseado em Éter , mas que também inclui sucessos de outros momentos de sua discografia. Leia também: Hardcore 90 Calvin Voichicoski: as canções que vem de dentro Pra me Lembrar de Insistir (Créditos: Yvã Santos) São quase duas décadas de estrada. Quando criaram a banda em Brasília, imaginaram que estariam no lugar alcançado hoje? Não exatamente, sempre olhávamos de uma forma passo a passo, em parte porque grandes conquistas pareciam muito longe. Mas tínhamos confiança que era possível. Ao decidirem revistar Éter , as lembranças daquele tempo retornaram para vocês? Além disso, hoje esse quinto elemento preencheram vocês? Retornaram sim, mais em forma de sentimentos do que de lembranças específicas. Não sei se nos preencheu, provavelmente não [risos] , mas certamente estamos na melhor vibe entre nós que já tivemos. O álbum marcou um momento de amadurecimento da banda. Vocês diriam que Éter representou uma virada criativa? Representou uma concisão criativa. O Real/Surreal explora mil gêneros que conceituamos de forma que fizesse sentido e justificasse aquela maluquice. No mesmo disco ter músicas como "Amanheceu", "Silêncio", "Danse Macabre" e "Ilustres Desconhecidos" e etc. No Éter já tínhamos uma maturidade maior e uma calma de que não precisava fazer tudo num mesmo disco. A banda conta com fãs extremamente fiéis, ou seja, estão presentes desde o início. Como vocês veem a conexão dos fãs com o álbum hoje em comparação com 2015? Ainda estamos entendendo isso. Nos shows ficamos surpresos com uma música ou outra que não tocávamos há muito tempo, como a galera sabe a letra do começo ao fim. Tá rolando uma nostalgia e legal ver que estamos envelhecendo junto de parte do nosso público. Em tempos que o mundo muda rápido e o consumo do entretenimento não favorece longevidade, tem um valor bonito essa conexão. Como é para vocês ver uma nova geração descobrindo Scalene agora? É demais! Curioso pra entender a percepção da galera mais nova sobre o nosso trabalho. Acabamos de voltar, ainda precisa de mais tempo pra sacar como vem essa nova geração em relação ao nosso trabalho. Em "Sublimação" há uma estrofe que pode ser aplicada em diversas vertentes - “Tantos padrões, imposições afastam / De encontrar nossa própria essência”. Aplicando na trajetória da banda, pergunto: vocês encontraram a essência desejada? Acho que cada integrante responderia de uma forma diferente. Pessoalmente sinto que encontrei até, mas não necessariamente consigo atuar e viver conectado à ela. Talvez seja uma segunda etapa do processo que não mencionamos na letra [risos] . Já em "Furacão" vocês se questionam sobre para que lado devem ir. Atualmente, existe uma direção que desejam ir? Essa letra fala, em parte, sobre o caminho e o movimento serem a busca em si. Não existe destino. Quero paz e tranquilidade pra me expressar através da banda e me atentar ao equilíbrio da vida profissional com a vida pessoal. Talvez 10 anos depois eu não concorde 100% com a letra no sentido de ser "no furacão que surge a porta". Certamente faz sentido, mas acho que há outras formas de haver mudança e evolução. "Quimera", a nova música da Scalene Monstro da mitologia grega, a quimera remete ao impossível. Lançada neste ano, o single dá continuidade ao éter, harmonizando os elementos. De acordo com Gustavo Bertoni, "Quimera" é resultado direto desta turnê comemorativa de Éter que está acontecendo este ano: "Acho que tocar as músicas do disco e entrar em contato com o que curtimos na época nos instigou a buscar nos HDs antigos alguma demo que acabou não entrando no álbum em 2015", ele diz. O esqueleto da canção estava ali e ainda segundo o vocalista e guitarrista, "foi divertido retrabalhá-la para alimentar criativamente esse momento entre nós, mas também como um presente aos fãs", completa Gustavo. "Ela vai bem no nosso âmago ali do post-hardcore, perpassa pelas brasilidades do Magnetite e soa meio soturna como o Labirinto . Contempla diferentes momentos nossos sem necessariamente apontar para uma futura sonoridade a ser explorada." "Quimera" dialoga com Éter - seja pela nostalgia ou mitologia. Como foi revisitar o passado para encaixar a canção neste momento de celebração? Foi bem natural. Nosso alinhamento acontece geralmente muito rápido. "Quimera" acabou sendo uma música com o espírito de 2015 com a produção de 2025. E é a primeira música produzida por nós mesmos, então ela vai ficar marcada na nossa discografia por esse significado. Composta por Gustavo Bertoni e Tomás Bertoni e com produção musical da própria Scalene em si - que também inclui Lucas Furtado no baixo -, "Quimera" traz Maick Souza na bateria, mix de Ricardo Ponte e master de Erwin Mass. Turnê comemorativa Após uma apresentação esgotada no Cine Joia, no último mês de abril, a banda dá continuidade a turnê de dez anos do segundo álbum. Scalene passará por Recife (28/06), Brasília (05/07), Juiz de Fora (23/08) e Rio de Janeiro (24/08). Garanta o seu ingresso aqui .
