top of page

O primeiro encontro entre Ítalo Riber e Victor Fortes aconteceu em 2017. No ano seguinte, os músicos tocaram juntos no projeto de Pêu Ribeiro "Alienpovo" e acabaram fortalecendo os laços. Assim, surgiu o duo Dormente , em 2019, que utiliza diversas camadas de sintetizadores, trazendo uma sonoridade retrô/futurista. No ano passado, Dormente lançou seu segundo álbum, " Abismo Informação ". Continuidade (consciente ou não) de " Parestesia ", o disco aborda questões pessoais vividas e sentidas pelos integrantes durante o isolamento social. Enquanto cantam, a dupla cai no próprio abismo - mas não é algo negativo, pelo contrário, ao fazer isso, Italo e Victor mostram que é possível sobreviver (e por que não dançando?) com os diversos obstáculos da vida. "Esse álbum foi composto entre 2020 e 2021, e tinha planos para ser lançado em 2021, que era o momento que fazia mais sentido com a temática do álbum: pandemia e o caos político. Porém, o tempo foi passando e perdemos essa janela, o álbum se tornou uma fotografia do contexto da época, e lançar agora criou outro sentido, como um modo de lembrar de todas aquelas situações e sentimentos que vivemos, um registro histórico musical da minha sobrevivência no fascismo brasileiro, embora esse "passado" ainda esteja entre nós", explica Victor. Leia também: Show: Pérolas Negras A granada existencial da DINGO As brincadeiras de Bel Carvalho Vocês se conheceram em 2017 e se aproximaram logo de cara. Como foi esse encontro e quando perceberam que precisavam criar um projeto musical? Ítalo: A conexão aconteceu de uma maneira bem interessante. Eu estava em turnê com a cantora Paula Cavalciuk e estávamos ouvindo algumas músicas novas ainda desconhecidas por nós. Foi quando o Vini Lima, guitarrista da banda naquela época, colocou algumas músicas de um dos mil projetos que o Victor tinha, nesse caso foi a Branch of Yore. Achei bem legal e dei uma pesquisada. Assisti alguns clipes caseiros psicodélicos e fui descobrindo os outros projetos. Percebi um potencial criativo enorme e já em lapidação. Por coincidência ou não, nessa mesma turnê o Victor entrou em contato comigo perguntando se eu conhecia algum baterista para integrar a Branch of Yore. Essas coisas que o universo prepara mesmo. Eu me ofereci pra gravar com ele e a partir daí fomos alinhando as ideias. Com esse projeto a coisa não caminhou tanto porque o convidei logo de cara para integrar a Alienpovo, projeto novo do Pêu Ribeiro, que também tocava comigo em outros trabalhos. Nesse tempo nossos laços se estreitaram de fato e começamos a bolar as ideias em relação ao que se tornaria a Dormente. O formato de duo só veio no final do processo de produção do álbum "Parestesia", que foi todo composto e gravado pelo Victor. Eu sempre contribui com seleção de repertório, direção artística e musical e o Victor com a direção criativa. "Abismo Informação" dá continuidade aos assuntos que foram abordados em "Parestesia": dificuldades cotidianas e o sufoco do individualismo. O que levou vocês a trazerem essas questões existenciais no segundo álbum? Victor: De todos os processos na hora de compor uma música a letra pra mim é a mais difícil, eu não me considero um bom letrista e nem possuo um repertório tão extenso de assuntos, então para mim é mais natural escrever sobre mim, sobre as coisas que orbitam ao meu redor ou sobre as minhas visões do mundo, por isso a similaridade na questão temática entre os dois álbuns. "Abismo Informação" aborda os sentimentos de um jovem com seus próprios defeitos e personalidades, mesmos sentimentos e sensações que carregamos dentro de nós. O que vocês querem despertar nos ouvintes? Como sobreviver com os nossos pontos positivos e negativos? Victor: Acho que às vezes temos a sensação de que é só a gente se sente assim, ou de que o que sentimentos é bem pior do que os outros, como em uma espécie de competição, a função principal dessas músicas na minha opinião é dizer que "você não está só, podemos estar numa fase ruim mas vamos superar isso juntos" e trazer uma representatividade para aqueles que se sentem do mesmo jeito. O álbum foi criado no contexto da pandemia e isolamento social. Agora, estamos melhores, tendo uma certa liberdade. Os sentimentos retratados desse jovem no álbum continuam os mesmos ou podem ser alterados já que estamos em "outra" realidade? Victor: Existem sentimentos que surgiram nessa época e outros que já existiam mas se intensificaram, após toda aquela turbulência certamente houve progressos e um alívio momentâneo paira no ar, mas acho que ainda é muito cedo pra dizer que os tempos ruins já foram, pois parece que ainda estamos na iminência de tudo voltar, mas os sentimentos sempre mudam com a realidade. O álbum também faz uma analogia ao mundo digital. Qual é a relação de vocês com o mundo tecnológico? Por que somos reféns de aparelhos eletrônicos, caindo em um abismo existencial? Victor: A tecnologia vem evoluindo muito rapidamente nos últimos anos, e acredito que nosso processo de adaptação não está sincronizado com essa evolução, e quando a sociedade num geral não entende totalmente uma tecnologia ficamos a par da boa fé daqueles poucos indivíduos que entendem, hoje a inteligência artificial e os algoritmos definem o que gostamos e o que consumimos na internet nos tornando totalmente dependente delas, e essas tecnologias não estão nas mãos da classe trabalhadora, então não são neutras nem a nosso favor. Para finalizar: como não cair em um abismo? Victor: você pode desviar dele, mas ainda assim outros podem cair, então é melhor fechá-lo. Acompanhado por música e pela Dormente, o abismo perde sua profundidade e é possível levantar da cama para dar continuidade.

O abismo dançante de Dormente
bottom of page